Quando vamos nos aproximando de Copas do Mundo FIFA ou Jogos Olímpicos e Paralímpicos a tendência é que sejamos bombardeados por diversos clichês nas inúmeras mídias que seguimos, sejam elas tradicionais como rádio, televisão e jornais ou até mesmo novas mídias como Twitter, Facebook, e YouTube. Talvez, no mundo dos esportes, o maior clichê de todos que vai nos impactar nessas mídias – seja para os eventos citados acima ou outros como o Super Bowl ou até mesmo o Carnaval – é de que “[insira aqui] é o maior evento da terra”.
Esse clichê de certa forma nos faz pensar que estamos todos ao redor do mundo ligados, conectados e consumindo simultaneamente o mesmo evento. Mas será que ele é mesmo um só, e todos estamos consumindo igualmente?
Durante a Copa do Mundo Masculina FIFA em 2018, eu – por curiosidade acadêmica – assisti a jogos em diferentes canais de televisão ao redor do mundo (TF1 francesa, Globo brasileira, Telecinco espanhola, Telemundo norte-americana, ITV e BBC britânicas, SWT sueca e Channel 1 russa). A experiência de assistir os diferentes jogos em canais pelo mundo todo me fez refletir como o mesmo evento poderia se tornar múltiplo pela simples forma como a narrativa esportiva é conduzida. O que comentam, como comentam, como interpretam lances polêmicos, etc tudo pareceu distinto nesses diferentes canais.
Mas existiria outra forma – um pouco menos empírica – de se ver a existência de múltiplos eventos em um só?
No dia 20 de Junho de 2018 eu coletei uma rede com 70.000 nós e 100.000 linhas seguindo o Twitter das emissoras oficiais de televisão da Copa do Mundo FIFA 2018. Nesse dia tivemos os seguintes jogos: Uruguai x Arábia Saudita, Portugal x Marrocos; e Irã x Espanha. Na visualização abaixo o tamanho dos nós reflete Prestige In-Degree e as cores refletem as diferentes línguas dos perfis (Inglês – Azul Claro; Espanhol – Laranja; Português – Verde; Francês – Rosa). Essas quatro línguas representam 77% de toda a rede.

E o que podemos notar? Em primeiro lugar é de que as emissoras oficiais são normalmente os maiores nós na rede, e em segundo lugar é que temos clusters bem claros formados ao redor dessas emissoras. Mas o interessante para mim é o fato de que essas comunidades normalmente são formadas por perfis de uma mesma língua, e o mais importante: da mesma língua que a emissora. De certa forma confirmam o que Benedict Anderson propôs em relação ao papel da mídia em formar comunidades imaginadas.
Poderíamos extrapolar e dizer que um(a) brasileiro(a) – por ter um perfil no Twitter em Português – interagiu somente com a Globo, SporTV, e a Fox Sports Brasil (as três emissoras oficiais no território brasileiro) – e dessa forma consumiu uma Copa do Mundo 2018. Já um(a) francês(a) – por ter um perfil no Twitter em Francês – acabou por interagir somente com a beIN Sports e TF1 e dessa forma consumiu outra Copa do Mundo 2018. Mesmo vendo as mesmas imagens geradas diretamente da Rússia, esses dois indivíduos acabaram por consumir eventos distintos pela simples adição de diferentes comentários na transmissão televisiva e nos tuítes das emissoras.
Então, será que a Copa do Mundo FIFA é mesmo um evento global? Ou seriam múltiplos eventos locais?